quinta-feira, 5 de março de 2009

Opera Crioulo no Expresso

Lisboa, 05 Mar (Lusa) - A ópera dançada "Crioulo" conjuga o belo, grotesco e sagrado da história de Cabo Verde, segundo o criador António Tavares, que, em parceria com Vasco Martins, é mentor do espectáculo, com estreia marcada para 27 de Março, em Lisboa.

O espectáculo é uma "fusão do passado, presente e futuro de Cabo-Verde, e tem como forte temática a escravatura que marcou a história do povo", descreveu o coreógrafo e bailarino em entrevista à Agência Lusa durante os ensaios, no Centro Cultural de Belém (CCB).

Uma primeira versão de "Crioulo", musicada por Vasco Martins, foi apresentada em 2002 na Rua de Lisboa, via principal da cidade do Mindelo, considerada a "capital cultural" de Cabo Verde, no âmbito da programação de "Mindelo Capital Lusófona da Cultura".

António Tavares, responsável pela direcção artística e coreografia, e Vasco Martins, autor da música e do libreto, introduziram elementos de raiz tradicional numa estrutura de base clássica, convidaram músicos de várias ilhas do arquipélago, e outros na diáspora, e fundiram no espectáculo todas aquelas referências.

"O Vasco [Martins] tinha essa ideia de uma peça com linhas baseadas na História de Cabo Verde mais multidisciplinar para alcançar dimensões operáticas", recordou, sobre a génese da parceria.

Do trabalho conjunto resultou "uma ópera essencialmente dançada, com a música a complementar, e vice-versa, e a vertente plástica a dar a dimensão histórica e narrativa", descreveu António Tavares, fundador dos grupos de dança cabo-verdianos Crêtcheu e Compasso Pilon nos anos 90.

Passado, presente e futuro atravessam a dramaturgia, começando pela História da formação de Cabo Verde, ancorada na música, com textos baseados em cânticos populares de trabalho, seguindo-se o tempo presente, apresentando o mar como via e fosso entre a África e a Europa, e finalmente o futuro, representado pela dança, que conjuga as dicotomias do passado.

Vasco Martins, que reside no Mindelo, onde tem desenvolvido o seu trabalho como compositor muito inspirado na música tradicional cabo-verdiana, foi buscar para o espectáculo os ritmos africanos da "morna", da "coleixa" e da "valsinha", mas também a música ibérica insular, e da música clássica europeia.

Em palco, a presença de grandes caixas de metal gradeado evoca a história trágica e grotesca da escravatura, contrastando com os movimentos amplos e livres dos 15 bailarinos em seu redor.

As caixas "são um grito de silêncio, como na pintura de [Edvard] Munch" - comparou o coreógrafo, que já trabalhou com artistas como Olga Roriz e Francisco Camacho - sublinhando que a escravatura "é uma temática que continua actual, embora noutros moldes".

O artista optou por um cenário minimalista. Usou dezenas destas caixas gradeadas em palco como metáfora do porão dos barcos que transportavam os escravos negros há quinhentos anos.

Com uma duração de cerca de duas horas, a ópera, em três actos, tem como vozes principais a soprano Carla Simões e Sara Tavares, acompanhadas pelo Coro Vozes Caelestes, o Quarteto Artzen, com direcção musical a cargo de Pedro Neves.

António Tavares explicou que a soprano Carla Simões representa "uma vertente espiritual", enquanto que Sara Tavares "é o 'alter ego' que conduz o espectador para o interior do imaginário" da ópera.

"Crioulo" - co-produção do CCB e da associação cultural Procur.arte - tem estreia marcada para as 21:00 de 27 de Março no grande auditório do CCB, em Belém.

AG.

Lusa/Fim

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